Um ataque direto e poderoso às doenças!
Surgem novas terapias criadas com recursos da nanotecnologia.
Elas já curam câncer de pele e prometem maior eficácia contra a
diabetes. É o comeco de uma nova era na medicina
Rachel Costa, para ISTOÉ magazine
Há uma revolução invísivel na medicina. As protagonistas dessa mudança são estruturas minúsculas, cerca de 90 mil vezes menores do que um fio de cabelo, conhecidas por nanopartículas. De tão pequenas, são visíveis apenas com a ajuda de microscópios ultrapotentes. Do mesmo modo que as famosas células-tronco, elas são responsáveis por avanços impressionantes nos tratamentos. Sem sombra de dúvida, pode-se afirmar que são um dos pilares de sustentação da medicina do século XXI. E o que é melhor: as pesquisas em nanobiotecnologia, como é chamado esse novo campo de estudo, se encontram em estágio avançado e começam a dar frutos. Um levantamento da agência internacional Thomson Reuters mostrou que, só no ano passado, foram requeridas no mundo mais de 300 patentes de produtos relacionados à saúde envolvendo nanotecnologia. O crescimento dessa área motivou o FDA, a agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos, a criar um grupo exclusivo para regulamentar os lançamentos que incorporam essa tecnologia.
A razão do sucesso das nanopartículas está nas potencialidades que surgem quando uma molécula maior é submetida a sucessivos processos para reduzir seu tamanho. Podem, por exemplo, se tornar mais resistentes ou adquirir a capacidade de conduzir eletricidade. São justamente qualidades como essas que têm sido exploradas por centros de pesquisa e pela indústria farmacêutica. O propósito é criar formas inéditas de levar medicamentos diretamente até as células doentes, além de testes diagnósticos mais sensíveis. Como mísseis teleguiados, programados para detonar apenas quando chegam ao alvo, as nanopartículas são capazes de direcionar os fármacos às regiões atingidas pelas enfermidades, amenizando a intensidade dos efeitos colaterais e o desperdício do medicamento no organismo – dois problemas comuns nas terapias convencionais. Essa precisão torna possível usar doses maiores da droga, reduzindo o tempo de tratamento. É uma revolução que já apresenta resultados concretos no tratamento de doenças como a hepatite C e o tipo de câncer de pele mais comum. Também está trazendo avanços promissores para enfermidades de grande alcance, como a diabetes e o acúmulo de placas de gordura nas veias.
A razão do sucesso das nanopartículas está nas potencialidades que surgem quando uma molécula maior é submetida a sucessivos processos para reduzir seu tamanho. Podem, por exemplo, se tornar mais resistentes ou adquirir a capacidade de conduzir eletricidade. São justamente qualidades como essas que têm sido exploradas por centros de pesquisa e pela indústria farmacêutica. O propósito é criar formas inéditas de levar medicamentos diretamente até as células doentes, além de testes diagnósticos mais sensíveis. Como mísseis teleguiados, programados para detonar apenas quando chegam ao alvo, as nanopartículas são capazes de direcionar os fármacos às regiões atingidas pelas enfermidades, amenizando a intensidade dos efeitos colaterais e o desperdício do medicamento no organismo – dois problemas comuns nas terapias convencionais. Essa precisão torna possível usar doses maiores da droga, reduzindo o tempo de tratamento. É uma revolução que já apresenta resultados concretos no tratamento de doenças como a hepatite C e o tipo de câncer de pele mais comum. Também está trazendo avanços promissores para enfermidades de grande alcance, como a diabetes e o acúmulo de placas de gordura nas veias.
As versões nanoestruturadas de medicamentos convencionais têm se mostrado eficazes para a terapia de algumas doenças graves. Uma delas é a leishmaniose visceral, mal parasitário que destrói fígado e rins, entre outros danos, e pode ser fatal. Neste caso, a principal vantagem do remédio com nanopartículas é a redução do tempo de internação e dos efeitos colaterais. A droga (Ambisome) está disponível no Brasil, assim como a formulação nano do remédio para o tratamento do sarcoma de Kaposi (tumor maligno do sistema linfático que ocorre em pacientes com Aids), chamado Daunoxome. Há também medicamento nano para hepatice C (Pegasys) e anemia de origem renal (Mircera). “Quem usa os remédios nanoestruturados pode sair da quimioterapia e ir direto para o trabalho, sem sentir enjoos. Eles oferecem realmente menos efeitos colaterais”, diz Ana Luiza Toscano, supervisora da quimioterapia do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo. No caso da hepatite C, a nano facilita a adesão ao tratamento. Enquanto o interferon normal deve ser aplicado a cada dois dias, o produto com nanotecnologia é ministrado uma vez por semana. O empresário Rubens Victor Santos, 55 anos, de São Paulo, usou as duas formas. “A terapia com o nanoestruturado é mais cômoda e as reações foram um pouco mais suaves”, diz.
SEM CIRURGIA
O câncer de pele de Cid foi curado com uma pomada
nanoestruturada e banhos de luz
O câncer de pele de Cid foi curado com uma pomada
nanoestruturada e banhos de luz
Se depender do volume de pesquisas, em breve haverá uma nova safra de remédios nanotecnológicos. Uma das áreas mais beneficiadas será a oncológica. A equipe da pesquisadora Eva Marie Harth, que faz parte de um grupo que engloba cientistas das universidades americanas de Washington, Emory e Vanderbilt, trabalha no desenvolvimento de uma nanoesponja, estrutura de poliéster do tamanho aproximado de um vírus, que recebe em suas paredes algumas substâncias que se ligam apenas às células tumorais. Em testes com animais, foram obtidos resultados de três a cinco vezes mais eficazes do que os tratamentos tradicionais para o câncer. “Com as nanoestruturas, é possível administrar o fármaco apenas onde se encontra o tumor, poupando os demais órgãos e tecidos”, disse Eva Marie à ISTOÉ. De fato, um dos maiores problemas da quimioterapia é que os fármacos capazes de destruir as células tumorais são muito tóxicos para todo o conjunto celular, causando diversos efeitos colaterais.
PRODUÇÃO
Remédio nano é fabricado em centro
de alta tecnologia na Alemanha
Remédio nano é fabricado em centro
de alta tecnologia na Alemanha
Outras opções para determinar onde a droga irá agir são as terapias fotodinâmicas e o uso de ondas magnéticas. Na primeira, o medicamento só age quando exposto a um tipo de luz. Na segunda, um campo magnético é gerado na área a ser tratada, atraindo as nanopartículas para a região. Foi por meio do tratamento com luz que o engenheiro Agustin Gonzalez Cid, 67 anos, de Barueri (SP), se curou de um câncer de pele do tipo não melanoma, o mais comum dos tumores de pele. “Os médicos passaram um creme na região afetada e, depois de duas horas, aplicaram luz vermelha”, conta.
Sucesso na cosmética
Foi a partir do uso em produtos cosméticos que a nanotecnologia ficou mais conhecida. O motivo para a sua vasta aplicação nesse segmento é a eterna batalha dos fabricantes para os produtos chegarem às camadas mais profundas da pele.
“A maioria dos princípios ativos dos cosméticos não atravessa a pele por causa da barreira protetora existente na sua camada superficial”, constata Bartira Bergmann, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na tentativa de vencer a proteção natural do organismo, a indústria da beleza introduziu em suas formulações as nanoesferas es lipossomas. “Elas são capazes de cruzar a primeira camada da pele e atingir a derme, em que são produzidos o colágeno e a elastina, substâncias que dão firmeza e sustentação. Isso melhora a ação dos produtos”, diz Bartira. Recentemente, a indústria nacional lançou filtros solares nano e estuda linhas anti-idade e acne.
Foi a partir do uso em produtos cosméticos que a nanotecnologia ficou mais conhecida. O motivo para a sua vasta aplicação nesse segmento é a eterna batalha dos fabricantes para os produtos chegarem às camadas mais profundas da pele.
“A maioria dos princípios ativos dos cosméticos não atravessa a pele por causa da barreira protetora existente na sua camada superficial”, constata Bartira Bergmann, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na tentativa de vencer a proteção natural do organismo, a indústria da beleza introduziu em suas formulações as nanoesferas es lipossomas. “Elas são capazes de cruzar a primeira camada da pele e atingir a derme, em que são produzidos o colágeno e a elastina, substâncias que dão firmeza e sustentação. Isso melhora a ação dos produtos”, diz Bartira. Recentemente, a indústria nacional lançou filtros solares nano e estuda linhas anti-idade e acne.
A terapia ministrada em Cid foi criada no Brasil pela equipe do químico Antonio Claudio Tedesco, do Centro de Nanotecnologia, Terapia Fotodinâmica e Engenharia Tecidual da Universidade de São Paulo, campus de Ribeirão Preto. Entre as vantagens, o procedimento é mais rápido, mais barato e menos agressivo do que a cirurgia para a retirada do tumor, que é a solução convencional. Atualmente, esse tratamento já pode ser feito em ambulatórios de São Paulo e Brasília e, até o fim do ano, chegará a Belém (PA) e a Rio Branco (AC). O grupo agora está pesquisando formas de usar o mesmo procedimento contra tumores na bexiga, próstata e útero. O grupo de Ribeirão Preto também criou uma pomada com nanocompostos para eliminar cáries e infecções na gengiva. “Ela mata as bactérias da cárie sem a necessidade de usar o motor para desgastar o dente”, explica o químico Tedesco. Como o produto usado na terapia dos tumores de pele, a pomada anticáries só entra em ação depois de ser bombardeada com luz vermelha.
Doenças de grande alcance, como a arterosclerose (provoca entupimento dos vasos e artérias, causa de infartos e derrames) também poderão colher frutos da nanomedicina. No Hospital da Criança da Filadélfia, nos Estados Unidos, os pesquisadores criaram uma nova geração de stents, que são pequenas próteses metálicas usadas para manter veias e artérias abertas e, desse modo, impedir a obstrução do fluxo sanguíneo. No novo produto, é possível repor as doses do medicamento contido no seu interior, o que evita o acúmulo de placas no dispositivo. “Ainda estamos testando em animais, mas o procedimento tem se mostrado eficiente”, disse à ISTOÉ o cardiologista Robert Levy, um dos líderes do estudo. Já na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, uma nanomolécula simulando as características do HDL, a fração boa do colesterol, promete varrer do interior das artérias as placas de gordura que podem causar obstruções.
No Brasil, o laboratório Cristália está concluindo os estudos de uma anestesia de longa duração e de uma nanoestrutura para potencializar o efeito das vacinas. Há boas promessas também no tratamento de doenças cerebrais degenerativas, como Alzheimer e Parkinson. “A grande vantagem é que a associação de nanoestruturas aos remédios permite atravessar barreiras que os medicamentos atuais não vencem, chegando ao interior das células cerebrais”, diz Tedesco. No Canadá, o foco dos cientistas da Universidade de Calgary é a criação de uma vacina com nanopartículas contra a diabetes tipo 1. A doença surge quando o sistema imunológico começa a destruir por engano as células do pâncreas responsáveis pela produção de insulina. A vacina ajuda o organismo a produzir algumas partículas que atacam essas células que estão trabalhando de forma equivocada. “As nanoestruturas guiam a droga e garantem que ela fique mais tempo no organismo, sem se degradar”, disse à ISTOÉ Pere Santamaria, coordenador do estudo. A vacina foi testada com sucesso em ratos e a equipe espera usar o mesmo princípio para outras doenças autoimunes.
Até as fraturas de ossos poderão ser mais bem cuidadas graças às pesquisas em nanotecnologia. Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o professor Anderson Ferreira está empenhado em combinar nanotubos a doses de ácido hialurônico – substância muito usada por dermatologistas no rejuvenescimento da pele. Os nanotubos são estruturas minúsculas e super-resistentes, feitas de carbono, usadas para levar o ácido hialurônico até a região danificada dos ossos. Seu objetivo é promover a cicatrização e a regeneração óssea. E ele está no caminho certo. Testes realizados em animais deram ótimos resultados.
Até as fraturas de ossos poderão ser mais bem cuidadas graças às pesquisas em nanotecnologia. Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o professor Anderson Ferreira está empenhado em combinar nanotubos a doses de ácido hialurônico – substância muito usada por dermatologistas no rejuvenescimento da pele. Os nanotubos são estruturas minúsculas e super-resistentes, feitas de carbono, usadas para levar o ácido hialurônico até a região danificada dos ossos. Seu objetivo é promover a cicatrização e a regeneração óssea. E ele está no caminho certo. Testes realizados em animais deram ótimos resultados.
Outra vertente importante para a medicina é a aplicação da nova tecnologia aos diagnósticos. Neste caso, o aumento de precisão trazido pelas nanomoléculas faz enorme diferença. Pesquisadores da Northwestern University, em Chicago, aprimoraram o teste para identificar tumores de próstata. Com a nanotecnologia, ele ficou 300 vezes mais sensível. O exame encontra no organismo indícios de uma proteína associada ao tumor. “Ele permite ver, prematuramente, se há chance de esse câncer voltar”, disse à ISTOÉ o urologista Shad Thaxton, um dos responsáveis pela pesquisa. Outros testes em desenvolvimento, para rastrear o câncer de próstata e de ovário, se utilizam de marcadores radiativos. “Quando as nanopartículas juntam-se às paredes das células doentes é possível ver as substâncias radioativas que carregam, por meio de aparelhos de detecção já existentes atualmente nos hospitais”, diz Mônica de Oliveira, da Rede Mineira de Pesquisas em Nanobiotecnologia.
DIFERENÇA
Santos recebeu doses do interferon
na versão nano contra a hepatite C: reações mais suaves
na versão nano contra a hepatite C: reações mais suaves
É no desenvolvimento de testes mais precisos que atua um dos mais renomados cientistas dessa área, Xiaohu Gao, da Universidade de Washington. Ele e sua equipe trabalham com a inovadora proposta de criar nanoestruturas com várias funções. Em seu laboratório, elas recebem um fio de ouro e são recheadas com óxido de ferro. “Essa combinação permite enxergar células cancerígenas que não seriam detectadas por nenhum outro teste conhecido”, disse Gao à ISTOÉ. No seu invento, o ouro aumenta o contraste e a precisão das imagens diagnósticas. Já o óxido de ferro, sob ação de um aparelho de ondas eletromagnéticas, faz as nanopartículas se agitarem. Como elas têm características que as faz grudar-se aos tumores, o especialista consegue ver lesões iniciais observando as células que se movimentam. Os testes de Gao estão sendo avaliados em animais.
A presença dos nanocomponentes também está deixando mais precisos equipamentos como microscópios e câmeras usadas em cirurgias. “Um dia chegaremos aos nanorrobôs”, prevê Marcos Pinotti Barbosa, coordenador do Laboratório de Bioengenharia da UFMG. “Implantados na corrente sanguínea, eles agirão como soldados inteligentes. Em uma missão destruirão um inimigo e, no dia seguinte, outro”, diz ele. Com a rápida evolução das pesquisas em escala nano, isso poderá se tornar realidade num futuro não muito distante.
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