Monday 25 January 2010

A palavra...




Sempre tive o dom da palavra, destarte fosse tímido quando criança e assim ainda o proceda já homem feito. Mas o mundo se curva ao poder da palavra.Escrita, então, pode provocar cataclismas, tsunamis, ao mesmo tempo que pode enlevar. Cecília Meireles pontuou em um dos seus devaneios que"felizes seriam os homens de boa redação, pois deles seria o reino das diretorias". Num mundo onde as novas gerações demonstram cada vez mais desapego à leitura e são movidos tão somente por estímulos visuais e sonoros, tamanho desleixo com a expressão escrita pode ser fatal. Percebe-se claramente um retrocesso comunicativo e os educadores têm sim que acompanhar essa evolução (involução, na minha modesta opinião de usuário da palavra). O que diriam os linguistas de plantão? A esses interessa mais a comunicação, as alterações da língua no tempo e no espaço, no que prontamente, em termos, concordo...Houve comunicação, seja através da palavras ou de grunhidos, o processo se completou...Minha concepção, entretanto, seria o registro cultural e formal dessas intercorrências, pois se assim não fosse, nem Saussure teria como postular as famosas teorias que os linguistas tanto idolatram. O registro formal para a posteriodade exige sim o uso da palavra escrita, mesmo em meio ao mundo totalmente 3 D em que vivem as novas gerações. Atentos a isso, nós educadores havemos de continuar nossa batalha pela valorização do símbolo... Incentivar a leitura de forma prazeirosa, não pela obrigação dos vestibulares (a expressâo "leitura obrigatória" é no mínimo deprimente). Não nos esqueçamos, porém, que palavras são também imprecisas e cheias de significado e são apenas sinais das coisas, não as coisas em si. E é bem dificil dizer, às vezes, quem está no comando. No meu caso, sempre tento o melhor, lançando mão de uma fertil e muito bem alimentada criatividade,imaginando, como Shakespeare, Freud e Jung (ou talvez tenha mesmo um dom) e materializando em palavras, mesmo camufladas, a minha visão clara da natureza humana.

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.

Monday 18 January 2010

Espelho meu...




Que ninguém se engane, escrever é difícil, tão difícil quanto quebrar rochas, já dizia Clarice Lispector... Só escreve bem quem muito leu, ou nasceu com graças intelectuais suficientes para observar o mundo e seus viventes, interiorizando e exteriorizando informações, sons, cores, movimentos, olhos e focinhos... Há de se observar também as reações, as caras, as bocas, a obviedade e a hipocrisia das pessoas... Há de impor sofrimento e mais ainda, passar por sofrimentos, desapontamentos e outros agravos que só a convivência com o animal dito civilizado pode trazer... Na adolescência eu escrevia quando tinha o coração partido. Não que este tivesse se partido tantas vezes. Mas garanto que naquela época escrevia para mim e somente para mim, apesar dos elogios rasgados da professora de português. Não tardou que eu percebesse que escrever para mim  mesmo fizesse algum sentido... Eu queria era espalhar aos quatro cantos as minhas histórias, meus contratos e distratos com a vida... Não é de hoje que não gosto de eviscerar meus sentimentos em poemas doloridos ou textos que ninguém entende... Isso deve ser relegado ao trato com meus demônios particulares, mesmo os inferiores... Neste blog, amado leitor, tenho pontuado textos novos, recentes e mais antigos, sempre contanto dos meus afetos, desafetos e família, viagens e outros quetais... O importante é dizer a que vim! Enquanto isso presumo trazer-lhes algum regozijo, afinal, eu passarei, mas minhas palavras ficarão! Presumir-me  lembrado daqui a uma centena de anos  com certeza já me traz assaz encantamento, posto que, quando não mais habitar essas plagas, estarei feliz e sorridente em algum outro lugar, mesmo encantado!





Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


Álbum de Família III - A Excomunhão!




Meu avô passava por grande contador de histórias. Homem inteligente, autodidata e anticlerical por excelência, sempre arranjava um motivo para incluir nos seus “casos” um personagem de sotaina, um usuário de batina. Isto se dera na sua terra, lá para os lado do Crato, nos seus  tempos de rapazinho. O sertão sempre fora palco de histórias esdrúxulas em que à vezes o trágico andava de par com o ridículo. Lugar pequeno, mentes retrógadas, onde se sobressaiam apenas uns poucos elementos mais esclarecidos, tal era a cidadezinha do meu avô no começo do século passado. Única diversão: missa aos domingos, animada pela banda local, cognominada a “Furiosa” devido a alguns músicos tão desafinados que espantavam os ouvidos delicados dos que privavam e tinham intimidade com Euterpe, a deusa da música e da poesia lírica. A banda fazia retreta no coreto da praça bem em frente à matriz e só silenciava no início da santa missa. O movimento crescia quando os fazendeiros e suas famílias se dirigiam ao povoado em suas charretes. Os empreiteiros vinham também nos seus cavalos a galope e faziam grande alarido ao espicaçar as montarias. Apeavam todos e as amarravam nas pilastras, acorrendo céleres ao chamado da religião. Isso quer dizer que ainda temiam “os castigos de Deus” e as “fogueiras de satanás” , argumentos poderosos que o padre Caetano usava para catequizar e aterrorizar a turba ignara. Só Tertuliano Bento não ia nessa conversa e fazia parte dos poucos “não tementes”, chegando mesmo a ser um rematado ateu. D. Filó, sua esposa, tentava salvar aquela situação sacrílega, confessando e comungando diariamente, além de concorrer para as “obras” eternas da igreja. Tantas fez o fazendeiro, tanto blafesmou contra os santos mandamentos que não houve súplica da piedosa mulher que conseguisse demover o padre da ameaça que fizera. O motivo, porém, era bem outro: o que ele estava  era danado porque os outros davam polpudas esmolas e o Tertuliano, afora o dinheirinho que  D. Filó conseguia surrupiar-lhe para as “obras”, jamais dera um tostão. Os beatos e beatas, terríveis sicofantas, mentirosos de marca maior, ajudavam a colocar mais lenha na fogueira e iam contar ao padre, deturpando sempre, os horrores que o Tertuliano andava dizendo. Estava decidido: excomunhão!
A essa época o fazendeiro andava a beira da falência e os negócios iam todos por água abaixo. A piedosa D, Filó atribuía essas desgraças à sua apostasia e ao abandono da fé. Na missa de domingo, a das dez que era quando o povo afluía em maior número, o sacerdote subiu ao púlpito para mais uma vez execrar o procedimento de Tertuliano Bento, participando a todos os fiéis, a partir daquele momento estava excomungado de acordo com os cânones da Santa Madre Igreja. Horrorizados, os beatos começaram por fugir até ao cumprimento do homem amaldiçoado. Se ele entrava num bar e pedia café, os presentes iam saindo de fininho, temerosos de se contaminarem agora ao contato com o embaixador do inferno. Até a esposa recusava-se já a dormir com o renegado e recolhendo as roupas, passara a repousar no quartinho dos fundos, o mais distante da casa. Aspergia constantemente a sala de jantar e os outros cômodos por onde passava o marido e se benzia apavorada na sua presença.
Diante de tamanha desdita não havia outra alternativa senão mudar da cidadezinha onde todos o tratavam como a um cão raivoso. Liquidou, pois suas últimas dívidas, ficou limpo e partiu de cabeça erguida. A esposa não o acompanhara, o que para ele não representava grande perda, uma vez que a mulher não lhe atendia mais as necessidades do sexo e nem ao menos lhe preparava comida, além disso, era mesmo uma “baranga”. Que ficasse lá com o padre e o beatério.
Como o mundo dá muitas voltas, para usar de um lugar comum, o nosso Tertuliano Bento foi se estabelecer em outras plagas, lá para os lados do Piauí, onde não soubessem do caso da excomunhão. A força do clero ainda dominava aquele pequeno universo, embora não houvesse mais inquisição. Sujeito esperto, honesto e corajoso, não se deixou abater e recomeçou tudo da estaca zero. Aos poucos foi se aprumando e dali a alguns anos voltou a ser o fazendeiro mais próspero da cidade onde aportara. Os anos se sucederam, até mulher nova e bonita ele arranjara e, benquisto por todos, comparecia a festas e tudo quanto era cerimônia para as quais sempre recebia convites. Foi num desses rega-bofes que ele se deparou com o antigo pároco e que não se sabia como, fora àquela festa. O padre não reconhecera aquele senhor grisalho e imponente, a sua antiga vítima, ao passo que Tertuliano Bento o reconhecera de pronto. Após os comes e bebes foram para o varandão da fazenda gozar a doçura da tarde de outono. Tertuliano bento tornara-se o centro das atenções: a safra do ano lhe rendera mais alguns milhares de contos de réis. Sultão, o animal de estimação que o acompanhava por toda parte, dormitava a seus pés: único senão na calmaria de vida que ele tinha agora, pois o cão, apesar de belo exemplar de perdigueiro, não engordava, por mais cuidados e tratos especiais que o dono lhe prodigalizava. Estava que era pele e osso.
Tertuliano bento teve então uma daquelas irreverentes idéias que lhe assomavam ao cérebro como antigamente. Ia tirar uma desforra do padre que o excomungara. Dirigindo-se a ele, lembrou-o da excomunhão que lhe impusera há tantos anos. O padre, desapontado diante daquela gente toda que poderia lhe render boas espórtulas, gordas esmolas, quis desconversar, porém o fazendeiro insistiu, acabando por lhe dizer: “Padre, depois que o senhor me excomungou, minha vida melhorou, como vê, e hoje sou um homem feliz e de grandes haveres.Queria, por isso, lhe pedir um grande favor...Sabe o que desejo?” E continuou, para pasmo do velho sacerdote: “Quero que me excomungue também este cachorro, é um animal de muita estimação, mas não engorda de jeito nenhum”.
Todo mundo caiu na gargalhada e o padre, que tencionava arrancar os donativos dos opulentos proprietários, não teve outro remédio senão imitar os outros: começou a “sorrir amarelo” e todos acabaram na maior pandega. Agora, se o cachorro foi “excomungado” é que não sei, porque isto meu avô não me contou...


Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.








Álbum de família II - A caçada...


Tio Eufrásio, irmão do meu bisavô paterno, conforme depoimento de minha avó, devia ser o oposto deste não só pelos haveres, como pelo temperamento. O velho Eufrásio era rico e possuía elevado número de escravos. Dizem que bonito, claro de olhos acinzentados, estatura máscula, ostentava um porte de grande senhor. Enérgico, temperamental até, costumava castigar os faltosos com a eficácia do seu chicote, no mais, um amigo sincero e um caráter incorruptível. Numa época em que só se falava o idioma de Racine, eles trocavam correspondência em Francês.
Vovó falava de tio Frasinho com admiração e respeito. Meu avô de vez em quando embarcava no então Presídio (assim se chamava a velha cidade) para ver o irmão em Altos. Na verdade, não só a saudade o levava a visitar o único irmão vivo, mas também as caçadas. Ambos praticavam o esporte dos reis e isto constituía tradição na família desde a mais remota geração. Cilindra, Leão e Romana, perdigueiros com faro apuradíssimo os acompanhavam nas excursões e a volta era aquele festim: codornas, torcazes, jaós, nhandus e em certas épocas do ano, as deliciosas perdizes. Onças, desde as jaguatiricas até as temíveis canguçu, excitavam-os para as aventuras venatórias e respeitantes à caça. Meu avô, na  époça um menino de uns dez anos, os seguia mato adentro, sem medo das caninanas ou das gigantescas aranhas que teciam teias tão espessas como arame. Os guias (na verdade escravos do Tio Eufrásio) seguia à frente, com facão de mato para abrir as picadas e também para desmantelar as “rendas” das laboriosas artesãs. Tais monstrinhos deslizavam raivosos pelos ramos, em busca de outras “tendas” onde montar labirintos.
Às vezes pernoitavam na mata para a caça grossa, geralmente mais acessível à noite. Os veados galheiros, por exemplo, bem tarde desciam já lentos e despreocupados à procura de água, deixando a descoberto as esgalças figuras. Cada qual esperava então o seu momento e oculto pelas sombras, mimetizando-se nas roupas semelhantes a galhos de plantas, detonavam as armas. É crença vulgar que caçador (ou pescador) mente por natureza, mas sem querer defender meus ancestrais que não cheguei sequer a conhecer, afirmo com convicção que não mentiam nunca. Faço questão da ressalva antecipada pelo sucedido que passo a relatar e que por não entrar na rol de histórias de caçadas, poderia suscitar dúvidas quanto à autenticidade da narrativas. Não estou certo, mas meu bisavô e seu irmão não eram homens de contar bazófias. Meu bisa, como de costume, passava uma temporada na fazenda de Tio Frasinho. OS fazendeiros e amigos das imediações ocorriam todos quando sabiam da sua chegada, pois teriam na certa boas caçadas com o maior entusiasta deles. Desta vez o Coronel Juca vinha pedir o seu concurso para liquidar uma onça que já estava se tornando lendária: ninguém conseguira localizar ainda a sua toca. Diziam que era preta e os que a avistaram chegavam a lhe dar uns dez palmos do focinho à cauda. Convenhamos, era onça para diabo. Já devorara meio rebanho da vizinhança e devastava com certeza com a caça fina. Qualquer dia poderia pegar uma criança ou até mesmo um homem, quem sabe.
Combinaram um sábado para liquidar a bichona. Usariam o mesmo método de sempre, isto é, ficariam espalhados, cada qual para uma pista, de assobio a tiracolo, para o sinal de encontro depois. Bisa levou a inseparável Cilindra e com aquela fleuma que lhe era peculiar, tomou por uma trilha, distanciando-se logo. Cilindra seguia cautelosa, de orelhas em pé, sentidos alerta, quase em posição de ataque e por instinto  sabia que a aventura seria das mais perigosas. Esta cadela viera da Inglaterra junto com um revólver, como presente de um amigo que voltara à pátria mãe e Bisa incorporara ao clã da família, tamanha a estima que lhe tinha.  Em dado momento ela atacou e virando-se para o dono, começou a “chorar” na linguagem inequívoca do faro. Levantara  as pegadas da fera que devia morar por perto. Cilindra nunca havia falhado. Examinou bem ao redor e resolveu ficar por ali. Descobriu um oco enorme de tronco secular e que nem sabia onde ia terminar, tamanho o emaranhado de pedras, galhos, outras árvores e arbustos pegados. Cabiam folgados dois homens com as malotagens, se permanecessem acocorados. Entrou para o toco disposto a tocaiar dali a onça. Caia a noite e a mata começava a adquirir um ar sonolento com os galhos pendendo ao sereno do orvalho. Quem nunca se deteve numa floresta fechada em noite pura, sozinho, entregue às elucubrações não, pdoerá avaliar a sensação de paz que envolve o ser nestes instantes.
O avô, home culto e estudioso, pertencia ao tipo panteísta, para quem somente Deus é real, que viveria para sempre segregado da civilização, não fora a família, vendo portanto ali o seu legítimo “habitat” . Calmo, sempre tranqüilo de consciência, numa “mata virgem” , esquecia-se dos demais e deixava o espírito à solta, em comunhão perfeita com a natureza que ele amava. Cilindra permanecia em silêncio, abaixadinha no oco, a seus pés. E o bisa, a essa altura já havia até esquecido de onças e outros bichos, embora a famosa “trochada de aço damasco” estivesse sempre rente.
Apanhou um cigarro enrolado, riscou a pedra no isqueiro primitivo e escancarou a janela das circunvoluções cerebrais, quando o pensamento voou célere. Não tardou, entretanto, que fosse despertado de suas sérias reflexões de uma maneira assaz desconcertante: abriu os olhos e junto do seu rosto, quase a lhe fazer cócegas com imensas barbas, uma cara cresceu medonha.Sabe-se que soltou um grito que fez a onça fugir em desabalada carreira pela mata, mas ele próprio não ouviu, tamanho foi o susto. Aquele oco era a “habitação” da fera. Foi este o primeiro e único fracasso da sua vida de caçador diletante.
Meu pai nos falava de seus mortos queridos, relembrando os tempos de sua meninice contente e sem problemas como os de hoje, e das histórias que ouvia contar. Ficávamos horas na sala de jantar numa meia penumbra, no doce aconchego do ambiente próprio às confidências. Foi numa noite assim, talvez Junho (não me recordo mais), o frio estourava os lábios da gente e comprávamos manteiga de cacau na farmácia do “Seu” Barbosa. Não se saia de casa, quase, e um circo mambembe que chegara, coitado, tinha os artistas à fome. Numa noite dessas recebemos a visita de um novo personagem no cenário da nossa família. Guardo uma vaga idéia daquele tio distante que nunca vira antes.Sei só que o vozeirão alegre enchia de calor a nossa sala e que sua mão enorme apertou com firmeza a minha pequenina. Mais alto que meu pai, pareceu-me igualmente muito mais corpulento. Com que então, que tio era esse com o nome de Leôncio e ares de “bom vivant”? E o era, sem dúvida. Ou melhor, fora, nos tempos de rapazola. Bisneto do saudoso tio Eufrásio, desbaratara quase a fortuna do velho em façanhas estupendas nos tempos de estudante na capital federal. Contava-se até a lendária história de uma ilha em que o moço estróina aportou e em vez que queimar pestanas nos livros, para lá levava as francesinhas da época, apanhadas pelos cafés boêmios. Uma ilha inteira, imaginem, só para ele e seus colegas de bacanal. Os anos passaram, o tio se fora, deixando-me, de certa forma, um vácuo imprescindível de sua espetacular presença.
Sou agora um anônimo na multidão dessa cidade tentacular, mas por incrível que pareça, não esqueço os “fantasmas” da minha infância quês e centralizava nos pais, avós e suas histórias – meus ídolos da vida inteira. Soube outro dia que o dito primo jaz em tumba colossal, na ainda e para sempre magnífica São Sebastião do Rio de Janeiro, cidade que coroou suas loucuras.
Como estará ele na outra vida? Como será agora? O que restará daquele estudante boêmio que sabia viver e muito bem aproveitar os momentos fugazes que uma existência encerra?


Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


Sunday 17 January 2010

Um Rei?

 cat-lentes de contato com os olhos - vampiro - Burning Man 2008
Dodô parecia ter os olhos de fogo. Nos meus três ou quatro anos era assim que o via: uma cara de tição onde crepitavam duas brasas vivas – as esclerótides de seus olhos. O medo que me inspirava talvez fosse pelo quê misterioso que contavam dele. Dijé, nossa agregada, moça feita  a quem mamãe me confiava às vezes, muito contribuía para aumentar o meu terror por Dodô. Ela dizia que o negro, feiticeiro, às sextas feiras ia ao cemitério desenterrar esqueletos de “anjinhos” , que utilizava no seu “canjerê”. De fato, naquelas noites valpúrgicas os tambores não cessavam até o amanhecer lá no Filipinho, é o que se sabia na cidade. Filipinho era o lugar onde pontificava o Dodô. Por que “Filipinho”? Há muito tempo o turco Filipinho montara uma tendinha que depois foi crescendo até se tornar uma boa “venda” (venda era a designação antiga para loja ou mesmo armazém na cidadezinha). Como o negócio era uma espécie de referência para os que iam para aquelas bandas, o nome do turco incorporou-se ao lugar e todo mundo passou a responder a quem perguntava: onde fica a casa de fulano ou a rua tal? “Lá no Filipinho”, e creio mesmo até os dias de hoje lá é o “Filipinho”. Segundo informações a mim passadas por vovó, a venda tinha de um tudo: linha, agulha, pó de arroz “Lady” (acho que era o único, ou então o mais famoso), querosene para lamparina, lingüiça, arroz, feijão, cachaça, não faltando nem o “fumo de rolo”, além toda leva de cigarros industrializados. Sei disso porque meu velho pai, fumante inveterado desde os 14 anos, colecionava carteiras vazias de cigarro, das quais me lembro Yolanda, Cassino, Liberty, Minister, Hollywood. Sabedores desse hábito, era comum meninos e meninas apanharem maços vazios nas ruas e trazê-los para a peculiar coleção, como também o fiz, comprando cigarros mundo a fora para tão similar passatempo. Peguei essa mania do prima Margareth, bem mais taluda do que eu e que não saía lá de casa para brincar comigo e me pegar peças também, como as das “balas de sabão”  que ela embrulhava em papel de seda e me dava. Descobrindo o logro ao abri-las eu botava a boca no mundo e lá vinha Dijé para enxotar a menina e lhe passar descomposturas... Mas eu falava de Dodô, o feiticeiro dos olhos de fogo. Via-o diariamente porque ele passava pela minha porta a caminho de não sei onde, quem sabe para ir ao cemitério exumar os “anjinhos”... Criança é muito impressionável e desde pequenino o sobrenatural exercia um grande fascínio em mim que acrescia mais e mais com as histórias de assombração que Dijé e os outros adultos me contavam. Ficava horas matutando o que seria aquele “feitiço” que atribuíam ao negro Dodô. Depois do banho tomado, era-me permitido ficar no portão da casa, mas sem arredar um passo fora. Morria de curiosidade quando via o negro passar e tinha muita vontade de falar-lhe, mas aquela cara medonha e aqueles olhos injetados davam á sua aparência qualquer coisa de demoníaco e metia medo em todo mundo. Eu soube ser ele “Rei dos Congados”  e todos os anos, no 13 de Maio, ele arrebanhava seu povo e saía à frente de outros tantos vestidos a caráter: cetim de cores berrantes, espelhinhos colados nas capas, capacetes adornados igualmente de espelhos e fitas coloridas, muita lantejoula e espadas de latão compunham o traje típico dos dançarinos. Para quem não sabe, o Congado é uma dança folclórica que representa a coração de um rei do Congo. Eles saltam, simulam lutas de esgrima onde as espadas brilham ao sol estalando a lataria, dando gritos selvagens dentro do seu canto nagô. São ainda resquícios do tempo da escravatura e o nosso folclore mantém ainda essa tradição em diversas cidades do interior do nordeste. Quem ensaiava ou inventava, sei lá, as coreografias, era o próprio Dodô, que escolhia as cores e os enfeites de cada membro e podia ser considerado o “Joãozinho Trinta” do pedaço. O espetáculo (que vi e revi somente na adolescência) agradava não só pela beleza e luxo do vestuário como pelas danças bárbaras. Era assim que se comemorava o 13 de Maio, com muita pompa e num clima para lá de eufórico. Ao término de cada “sessão”, um deles ia pela multidão “platéia” com uma bandeja na mão e um estandarte na outra, a recolher esmolas para o santo padroeiro. O estandarte uma efígie de São Benedito  de onde pendiam muitas fitas que os fiéis beijavam contritos. A bandeja, claro, ficava logo repleta e os acólitos iam passando o dinheiro para uma sacola. Depois, tornavam a correr o prato vazio, sucessivamente, até que partiam para outros pontos da cidade. O “clou” , atrativo principal da festança, acontecia à noite: Dodô com sua sanfona de oito baixos armava o “calango” e a cachaça rolava dos tonéis que ele ganhava dos fazendeiros da região. A maioria dos participantes trabalhava em pequenos sítios e fazendas locais, onde ainda havia plantações, entre a subsistência arroz, feijão e milho, umas réstias de algodão e cana de açúcar. Eu soube que no outro dia pos festejos, os patrões não poderiam contar com a turma que permanecera a noite inteira na folia. Quem passasse pela estrada das imediações veria, de espaço a espaço, dois, três e até mais bêbados caídos dormindo a sono solto. Dizem que no terreiro de Dodô, lá pela meia noite, o ambiente começava a ficar pesado e escurecido de nuvens de enxofre que denunciavam a presença de “Belzebu”  transfigurado num enorme bode preto. Os que freqüentava contavam horrores dessas noites fantásticas. Ouvia tudo isso dos adultos que comentavam os fatos sem perceberem que eu estava sempre por perto. Figura excêntrica que povoou minha meninice de imaginação fértil e ainda hoje, decorridos tantos anos, rememoro. Dodô, um rei cuja aura mefistofélica me amedrontava e tantas vezes me acordou em pesadelos fantasmagóricos,  mas com igual teor, me arrebatava.

(Passeando pela Lagoa Rodrigo de Freitas no finalzinho do ano passado deparei-me com esse outdoor... Meu Deus, tantos anos e viagens depois, alí estavam os olhos de Dodô - que com certeza já passou desta para melhor)- a  me perseguir... Aqui está pois, sua homenagem, pai Dodô!)

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.



Álbum de família I - Um retrato...


Na galeria dos homens notáveis no nordeste do Brasil do segundo reinado, ressalte-se a figura veneranda do Visconde Figueira Paiva. Senhor de grandes posses e muitos escravos (libertou-os todos antes da lei magnânima) era, no entanto, o oposto dos despóticos senhores feudais da época. Tido como santo, quase, realmente o era na imaginação acanhada, mas reconhecida dos seus servos, o visconde a todos estendia a mão de dar, a mão de espalhar bondades. Homem progressista, de larga visão construtiva, fez da Pádua que o acolhera uma cidade promissora. De sua contribuição ao bem público contam-se escolas, sede nova da penitenciária, prédio da câmara municipal e muitos outros. Embora português daquela leva de aventureiros que aqui aportaram com os olhos ávidos no nosso ouro e a mente prenhe de lendas fabulosas em torno de nossas riquezas pertencia aos de boa cepa, e, se amealhou fortuna, foi também um benemérito. Nas férias escolares, que invariavelmente passava com vovó, ouvia-a falar sempre do visconde e da sua morte trágica, advinda de sua bondade. Gostava de, ele próprio, distribuir biscoitos aos negrinhos da fazenda e, um dia, como de costume, meteu a mão na barrica para distribuição. A luz baça do lampião não lhe permitiu ver o que lhe picara ligeiramente a mão. Com certeza algum prego enferrujado pronto para ferir carne inocente. Não ligou para a gota de sangue que continuava pingando do dedo mínimo. Dali a instantes, apesar das providências caseiras até que se buscasse médico na cidade, foi piorando  e expirou em questão de minutos. Ninguém atinou com o estranho caso. Um prego enferrujado que fosse, poderia matar uma pessoa tão rapidamente? Certamente que não. Uma série de sintomas iria se agravando gradativamente e o processo inflamatório evoluiria para uma infecção até atingir o clímax da gangrena. Mas para tanto levava tempo, dias, um mês, quem sabe? Mistério. Vindita? Envenenamento proposital? Mas quem tentaria eliminar o visconde se ele não possuía inimigo e todos o amavam? Política? Até os mais ferrenhos adversários o respeitavam e admiravam a sobriedade com quem defendia suas idéias. Que fora envenenado não restava dúvida, mas como, e por quem? Após o violento impacto da morte do visconde, a vida na fazenda foi aos poucos voltando ao ritmo normal de trabalho, embora sempre chorassem o bom amo.
A viscondessa, uma francesa de passado meio duvidoso mas boa alma continuou a tarefa do marido, tendo herdado uma fortuna incalculável. A barrica de biscoitos já não era tão procurada para engabelar a fome dos negrinhos. Uma tarde alguém retornara ao quarto onde ela se encontrava.  E estava decifrado o enigma da morte do visconde: uma jararaca minúscula dormia enrodilhada no fundo, em meio aos biscoitos. Então, o bisavô da minha avó, o visconde Figueira Paiva de quem ninguém tivera queixas jamais, tem hoje nesse seu descendente uma pequena mágoa que o faz culpá-lo por um único ato de punição de toda a sua vida. Deserdara o filho mais novo, pai do pai do pai da minha bisavó e considerado a ovelha negra da família. Estróina autêntico, mas no fundo bom moço. Não fora tal cirscuntância de seu gesto, talvez eu fosse hoje um soleníssimo senhor de milhões e pratarias de Bonifácio Figueira Paiva, visconde bastante agraciado e distinguido no reino, a julgar pelos retratos onde as condecorações brigam para ocupar o peito largo.
Cheguei à conclusão sem dúvida um tanto amarga de que não nasci mesmo para a riqueza e foi melhor assim, pois talvez a essa altura estivesse  abominando e maldizendo os milhões que sobrariam na minha conta mas me confeririam por certo maior insegurança, a saber que em mim reverenciariam o ouro que a minha pessoa representaria e nunca, a mim mesmo, criatura humana sedenta de afeto e paz e eterno desencantado do gênero humano. Agora, compreendo, sim, e faz sentido, aquelas maneiras protocolares e cerimoniosas da minha avó e que resvalam até hoje em meus pais e irmãos, que ela sabia impor aos vizinhos, apesar do trato sempre afável. Descendia de fidalgos e o sangue que lhe corria nas veias transmitiu-lhe até o último suspiro, sem que percebesse, aquele porte altivo.
Mas cá para mim, pouco se me dá que eu tenha um ancestral coalhado de crachás e honrarias. Prefiro ainda a ovelha negra do meu antepassado que acabou seus dias romanticamente na ponta de um punhal!


Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


Friday 15 January 2010

Gentlemen's land II


Num frio avassalador encolhi-me num taxi e dirigi-me à estação Paris Nord de onde parte o eurostar com destino a Londres. Lá, onde uma teia de nuvens e névoa parece envolver tudo eternamente, morava um grande e valioso amigo brasileiro, agraciado pela profissão a residir no primeiro mundo. Mas voltando às luzes e cores de Londres, falo de David Hockney, que nascido num país onde no inverno às quatro e meia da tarde já é noite, soube captar toda a mágica luminosidade londrina, ao pintar um quadro onde o seu jovem amante, Peter Schlesinger, aparece ao lado de uma piscina. Mas há um conforto em Londres. Que roupa não combinaria com a luz tênue de um dia cinzento? Mais ainda entrar num taxi londrino é uma das melhores sensações do mundo. Depois te ter passado alguns dias em Paris, enfrentando os garçons e os taxis franceses? É um regozijo para o corpo e a alma. O “black cab” é confortável, seguro, elegante, discreto e não tem o cachorro do chofer de taxi parisiense babando no seu pescoço. Uma das maravilhas do trânsito e de deixar estarrecido qualquer motorista brasileiro é a “zebra crossing” , onde o carro é obrigado a dar preferência para o pedestre ´o que por si só já diferencia Londres de qualquer outra metrópole. Estar na terra dos “gentlemen” mais uma vez é no mínimo um privilégio. Mas quem realmente são esses homens coalhados de maneirismos e que tanto encanto provocam nas românticas de plantão? Ao típico, pouco culto e mal educado machão brasileiro, todos eles não passam de maricas. Mas engraçado ainda quando as próprias mulheres, à falta de qualidades suficientes para seduzir, descambam para o julgamento precipitado da opção sexual do indivíduo que no fundo só reflete a boa educação que teve. Terno, gravata, sobretudo, chapéu, cigarros longos, charutos e cachimbos, com as boas maneiras de quem estudou em colégio interno. Delicado ao acender o cigarro ou levar o charuto à boca, contido, com as mãos atrás do corpo, arrogante diante de uma mulher usando perfume francês forte, maquiagem carregada e falando alto. Trata-se de um indivíduo acostumado a não mostrar seus medos e angústias, como reflexo da auto repressão inglesa. Tais indivíduos foram assim criados com tanta finesse porque na Grã-Bretanha o que define a classe social é a cultura e a maneira de falar, não o dinheiro. E falando em gentleman, eu estava ali a convite desse amigo brasileiro, que conheci nos tempos de UERJ, quando morava em São Sebastião do Rio de Janeiro. Morou em Londres por muito tempo, como correspondente de um grande jornal brasileiro. Rapaz culto, viajado, algo de belo que hoje a maturidade só enaltece, era quem me guiava pelas investidas nas ruas e guetos da tumultuada “City”... Claro que merecerá capítulo à parte, nobre leitor!

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


Gentlemen´s land II


Sim, caminhar é a atividade cultural de minha predileção, por que não existe coisa mais sem graça do que ficar entrando e saindo de museus (que já vira antes várias vezes, of course), checando tudo que os britânicos roubaram das colônias. A cidade de Londres já é um museu. È muito mais inteligente andar pelas ruas observando as casas velhas e seu moradores jovens, os prédios baixos e os ônibus de dois andares, os músicos nos corredores do metrô e a leitura silenciosa nos vagões, ou o ar de enterro dos “pubs” à tardinha. À noite a pedida são ainda os musicais, depois de ter tomado um chope e jantado um “grub” , a comida do pub. A “Opera House” anda pouco recomendada, vez que está abarrotada de japoneses e latinos que mal sabem o enredo de “Madame Butterfly”. Pouco mais de duas horas depois, Frederico me esperava na Waterloo station. O tempo pareceu não passar para este que era o queridinho na Faculdade de Letras da UERJ e que ainda guardava nas faces rosadas o frescor da adolescência. Homem de inteligência acima da média e sempre encantadoramente elegante, era sempre um prazer imenso estar em sua companhia, fosse no Rio, São Paulo, Paris ou Londres! Anos atrás evitei de questioná-lo a respeito da sua opção de viver solitário. Certa feita, num restaurante de Paris, sem que eu nada perguntasse, apresentou-me a um rapaz um pouco mais novo, como o grande amor da sua vida! Frederico não poderia escolher melhor lugar para tentar ser feliz à sua maneira. Na Inglaterra, se o “gentleman” leva jeito de entendido e até tenha tido o seu “toma lá dá cá” no internato, o gay, por ser muito mais sofisticado, não se fecha ao sexo oposto, embora isso não signifique que goste de mulher. O elemento gay sempre fez parte da cultura britânica, mas é preciso, para se enquadrar, ser gay com atitude, sem alarde ou ânsia de “aparecer”. Oscar Wilde já questionou todas as convenções e muito mais, cento e tantos anos atrás. Nossos encontros, até hoje, são sempre cercados de gentilezas e afagos. Naquele dia fomos almoçar no “Le Caprice” e entre licores e risadas, pusemos a fofoca em dia para concluir, ao final de quase cinco horas, que estávamos lindamente solitários. Quer dizer, altos amores e viagens intelectuais, mas nada de sexo! “Temos que encontrar alguém que nos estimule também intelectualmente” , dizia. “Meu último namorado, aquele que te apresentei em Paris, lembra? Três anos atrás! Meu Deus...Três anos sem ninguém! Brigamos lá em Paris mesmo...” Quando fui falar de mim não foi diferente. Séculos sem um beijo na boca. E este é sempre o final de nossos almoços e jantares. Um a lastimar a solidão do outro e a confirmar o juramento de que cuidaremos um do outro quando a velhice chegar. Contei-lhe o episódio do “Mago do Cemitério” e seus olhos arregalaram-se, talvez como prenúncio de grande sofrimento ou grande felicidade. Era o que me dizia secretamente o seu doce e instigante olhar. Depois passeamos pela City até o cair da noite. Camden High Street, Charing Cross Road, minha preferida por causa das livrarias antigas e modernas, Cork Street, Fulham Road, Old Compton Street, Oxford Street, Regent Street. Lá pelas seis adentramos no primeiro pub com a idéia de saciar a sede e aquecer o espírito com um bom vinho branco, francês, de preferência. “Now and Forever” , fomos ver o musical CATS, por sinal recomendável, já que libera as emoções e o felino que há dentro de cada um de nós mas que infelizmente saiu cartaz depois de mais de trinta anos de apresentações em Londres. (acredito que ainda esteja em New York e em turnê pelo mundo, eu soube). A compensar o frio de Londres, a conversa se prolongou noite adentro até que na manhã displicentemente ensolarada de domingo, ele me deu carona até o aeroporto de Gatwick, prometendo-me uma vista em breves dias. Ainda bem que aprendemos a viver longe das pessoas que amamos. Ainda bem que podemos chorar quando a saudade dói. Já no ruidoso check in preparo meu espírito para a longa viagem de volta, onze horas nas quais revivi cada momento de encontro comigo mesmo...

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.



O mago do cemitério!



Continuava minha vigília e meditação no túmulo de Kardec, mas de repente despenco assustadoramente na concreta realidade da sonata individual de um violino e uma fria mão que me tocava o ombro: um velho baixo, atarracado, de olhar vítreo, pára de tocar e se dirige a mim. O temor de estar diante de um fantasma me paralisa a ação e as pernas tremem. Ele me aperta as mãos e se oferece para curar-me de uma dor aguda no tornozelo esquerdo (talvez pelas muitas caminhadas) que vinha me atormentando há tempos (e isto era verdade). A esta altura já estava em pânico, quase sozinho naquele campo santo, com um desconhecido para lá de bizzaro. Poderiam os mortos me defender de uma possível agressão? No ar só se escutava o pipilar dos passarinhos na ramaria. O “Pére Lachaise” fica num bosque fechado de árvores enormes envolvendo flores e túmulos. É verdade que o homem é um ancião, mas mesmo assim, a sua aparência fantasmagórica me metia medo. Para disfarçar, pergunto-lhe o nome: Levy Michel, sobrenome bastante vulgar para os judeus. De onde surgira tal criatura sem que eu percebesse sequer o ruído de seus passos nas folhas secas do parque? E a sua música que se fez presente apenas no meu momento de transe? Seria uma “visagem”? Fantasmas não apertam as mãos das pessoas e pelo seu “shake-hands” percebi que ele tinha ainda bastante vigor físico. E se for ladrão ou “isca” de ladrão? Onde foram parar minha fé e coragem tantas vezes comprovadas solitariamente nos caminhos do mundo? O velho retira do bolso alguma coisa (meu Deus, será um revólver?). Reconheci logo o objeto. Era uma “chadai” de aço, o que veio conformar minha suposição de início quanto ao sobrenome judaico. Aplica a enorme estrela de David na minha testa e murmura palavras cabalísticas, assim o creio, onde só conseguí perceber a hebraica “Adonai” (Senhor). Em seguida desloca a estrela, sempre a sustentando com força, para meu abdômen, e de novo se põe a resmungar em hebraico. A lengalenga era interminável, o que fez recrusceder o medo de me ver a sós com esse ser misterioso naquele universo de mortos. Por fim, mandou-me dar uma corridinha, livre da mochila e de uma sacola de compras que carregava. Como? Deixar meus pertences ao alcance de suas mãos? O olhar do homem era magnético e não resisití, caminhando de mãos vazias, mas com o olhar enviesado para os objetos deixados no mausoléu. “Vá e volte correndo ainda uma vez!”, ordena o “mago” e eu obedeci como um autômato, teleguiado, sabe lá o quê. A agonia pareceu-me, ia terminar, pois ele murmurou firme como um oráculo: “Vous êtes guérie” (você está curado). Num fiozinho de voz pergunto-lhe quanto lhe devia e ele responde que absolutamente nada. Despedi-me bastante atordoado da estranha criatura e atravesso as alamedas da necrópole sem deter-me um minuto a mais no túmulo de Kardec. Verdade seja dita, sei curtir como ninguém os encantos de Paris, mesmo sem muito dinheiro ou luxo...Estava vivo, bem vivo e depois desta insólita tarde de aventuras, hora de tomar uma injeção reanimadora: um “beaujolais” é a receita infalível. Entrei no primeiro barzinho que avistei e pedi um, dois, até três copos do precioso néctar. Ao fundo do barzinho havia um espelho embaciado e adivinhem quem eu vi refletido nele? Michel Levy, o velho do cemitério, que também tomava sua dose. Ele pareceu não me reconhecer e ali, em campo aberto, já não me amedrontava. Aproximei-me e paguei-lhe uns tragos. Ele agradeceu, olhou no fundo dos meus olhos e profetizou: “Monsieur, algo muito especial está para acontecer, e vai revolucionar sua vida” . Sem esperar pela minha reação, ele pegou o velho violino e se foi para sempre! O vinho aquecera-me a alma e transmitira-me uma euforia natural, e logo depois julguei que tudo não passou de uma das minhas fantasias. Mas tarde, já no albergue, remexendo a velha mochila para guardar o troco, encontrei um papelzinho que trago comigo até os dias de hoje, meio amarrotado, por sinal, onde leio: Levy Joseph, 9 Rue François Villon Gennevilliers, 92. Mas o homem não se chamava Michel Levy? Ali estava o endereço que me dera, portanto era um ser humano, não produto da minha fértil imaginação, e como todo bom francês, degustava o seu vinho diário. Atribuí a troca de nome à minha perturbação decorrente do terror que sentira.

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.

Thursday 14 January 2010

Voici, Edith Piaf!


"Monsieur, monsieur, s´ll vous plait" . Quem me chama nesse deserto povoado só de mortos? Volto-me, ainda confuso e assustado. Um guarda vem ao meu encontro e a minha surpresa é maior quando ele me estende um mapa do cemitério. Mostro-lhe o meu já bem velhinho (não é a primeira vez que aqui venho) e ele pede encarecidamente para ir ver Edith Piaf. Entrega-me o novo mapa onde está sublinhado com destaque o nome da cantora na divisão 97, ou seja, no final do campo santo. Nesse momento, Monsieur L´Argent tira do bolso um calhamaço e desfia sua idolatria pela saudosa Piaf. Começa a ler o poema, jura que compôs e até leu na televisão com sucesso. Decididamente o guarda não é "the right man in the right place". Revela-se, pois sim, um homem ingênuo e romântico, ingênuo demais para ser policial. Prometendo sastifazer-lhe a vontade, la fui eu em demanda pela sepultura da cantora. Não voltaria a vê-lo, pois sairia pela outra rua que fica nos fundos do cemitério e tem o nome de Rondeaux. Nada bonita em vida, tão grande na arte e no sofrimento, como soube amar a pequena Edith. Enquanto caminhava, veio-me à lembrança o seu belíssimo ¨Hino de Amor", que cantarolei em surdina. Caminhei pensando no fadário dos grandes artistas cujas vidas foram sempre pontilhadas pelo drama e pela tragédia. "Voici, Edith Piaf!" - Era assim que a apresentavam, ao som de tambores, nas mais importantes salas do mundo. A voz de Paris, sozinha no palco, de preto, luz no rosto e nas mãos. Fazia as platéias delirarem, conheceu glória e fortuna, fez tudo que quis...Teve muitos homens, entregou-se ao amor e soube cantar: "Eu irei ao fim do mundo, pintarei meus cabelos de loiro,s e você me pedir. Eu renegarei meus amigos, renegarei minha pátria, se você me pedir. Podem rir de mim, eu farei qualquer coisa, se você me pedir." (Hymme a l´Amour). Edith teve vida difícil. Nasceu nas ruas de Paris, abandonada pela mãe, criada pela avó paterna, que era dona de bordel. Foi prostituta, perdeu um filho ainda bebê, era viciada em drogas, teve câncer. O grande amor da sua vida, o boxeador Marcel Cerdan morreu num desastre de avião, indo ao encontro dela, de Paris para Nova York. Cantava a dor humana, escancarava o lado que as pessoas normalmente costumam esconder. Deparei-me alguns minutos diante do túmulo cantarolando suas músicas: "Quando ele me toma em seus braços, e me fala baixinho, vejo a vida cor-de-rosa". Aos 47 anos se casou com Theo Sarapo, um grego de 27 anos. Para cantar um dueto com ele, na sua última apresentação no Olympia, meses antes de morrer, escreveu: "Para que serve o amor?" E ele: "O amor faz sofrer...faz chorar...engana...e, quando acaba, provoca uma grande dor. Para que serve o amor?" Mais que emocionado, vi os portões de saída, criei alma nova e fui mais uma vez ao encontro da vida!

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.

"Pére Lachaise" - Começo ou fim? Ato segundo...





Sobe-se mais um pouco, mas sempre orientado pelo providencial mapa, e na divisão 44, o mausoléu formado de dólmens, cercado de flores de todos os matizes e igualmente de uma pequena multidão que ora, acende velas e traz mais flores. Dizem que é o túmulo mais visitado: Allan Kardec. Encimando os dólmens, a base da sua doutrina: "naitre mourir renaitre encore et progresser sans cesse telle est la loi" e mais abaixo, "as devise preferée: hors la charité, point de salut". Todos rezavam em recolhimento e concentração absoluta, uns mais fervorosos se aproximavam para tocar o busto como se daquele bronze frio pudessem emanar fluidos benéficos do seu espírito. Na mesma divisão quem fica na companhia desse iluminado ser, senão a excêntrica Sarah Bernhardt? Continua "dormindo" no caixão em que repousava em vida. Dizem que Sarah odiava o Brasil porque foi aqui que sofreu o acidente culposo no palco e que a deixou mais tarde mutilada (amputaram-lhe uma perna). Outra alma que "curtia" a excentricidade como gênio que era, também "vive" no "Pére Lachaise". Nascido na Irlanda, cumpriu o seu carma na terra num processo que abalou a era vitoriana - Oscar Wilde - o esteta de Dorian Gray, com seu ardente "affair" Lord Douglas. Imagino-lhe a figura bizarra passeando a sua exagerada elegância pelo Picadilly. Em decorrência do processo que abalou a Inglaterra, ele veio terminar seus dias em terra estranha e aqui está (?) nesta tumba faraônica como convinha à sua excentricidade. Enquanto isso, no "L´Hotel" onde morou, seu quarto vem sendo disputado até hoje por artistas e gente recheada de dólares à espera de terem a honra de dormir na cama do infeliz irlandês, hoje glória da literatura universal. Vai-se caminhando por essas paragens de eterna morada que são repousantes também para aquele que se dispuser a passar umas tantas horas entre esses mortos ilustres que entraram para a história. Rossini e Bizet estão próximos e quem sabe à noite se juntam para reviver suas óperas imortais, ou será que Chopin, nas vizinhanças de Cherubim, troca inspirações sonoras com o italiano, enquanto o poeta Musset tece louvores a "Mimi Pinson"? Alí está Balzac. acrescentará ele à sua "Comédia Humana" mais alguns tipos no afã de conseguir dinheiro para pagar as dívidas que o afliogiram sempre?
O cemitério é um bosque arborizado e muito florido e como estávamos no outono, as folhas já amarelavam e iam coalhando o chão, tecendo um imendo tapete dourado.Era uma quarta feira de trabalho que não atraira visitantes, a não ser no túmulo de Kardec, o que faz supor que o espiritismo acolhe cada vez mais adeptos, já pela necessidade que as pessoas têm de, neste mundo de fim e de começo de milênio conturbado pelas desigualdades sociais, marcado pela violência e pelas doenças misteriosas que vão surgindo (sem falar de economia...), se apegarem a algum tipo de crença; e a verdade é que todos buscam esperança naqueles que deixaram exemplos de amor e bondade. Volto sempre a esse oásis de tranquilidade todas as vezes que vou a Paris, com a mesma intençao de, reverenciando sempre , os apóstolos do bem, renovar-me para a vida diante desse jazigo simples que guarda o corpo de um homem diferente do comum dos mais, vem-me à lembrança meus verdes anos, que me trazem de volta grandes mulheres e momentos, como quando mamãe (ainda cheia de vida...) e vovó (sentia sua presença lá comigo), cujas presenças norteadoras da minha existência - tem toda razão quando diz (e dizia...) - os mortos não morrem, passam sim, para outro lado, mas continuam. Mas o que levou o professor de Lyon a codificar a nova doutrina? Segundo se conhece de sua biografia, Allan Kardec recebera a missão de entidades do espaço que também lhe comunicaram esse pseudônimo, que usara na penúltima encarnação, como sacerdote dos druidas que fora. Seu nome verdadeira era: Léon Hippolyte Denizard Rivail. Encaro a placidez do seu semblante no busto que encima a lápide. Braçadas de flores frescas, reveladoras dos muitos que ainda cultuam sua crença, estão espalhadas em derredor. Choro por dentro lembrando meus motos queridos, mas a mesmo tempo conforta-me a certeza que eles "vivem" e poderiam estar naquele momento ali, aplaudindo o meu gesto: espíritos não têm fronteiras!

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.



Pére Lachaise" , fim ou começo? Primeiro Ato



Estômago satisfeito após degustar o menu soberbo (e bem em conta, diga-se de passagem) do "Pied de Cochon", na boca ainda o "bouquet" oloroso de um "beaujolais" , marcho, bem nutrido, pleno de vida, em direção aos caminhos da morte. Calma, gentil leitor, não cometerei o ato corajoso do suicídio pois muito hei de zanzar pelas aléias da vida, ainda. Dizendo assim pode parecer que se está em vias de se cometer um desatino. Este não era bem o meu caso: é que Paris é feita de paradoxos divinos e surpreende eternamente. Se teve um "Brillant-Savarin" com o seu "Filosofia do Gosto" (todos sabemos que a cozinha da França é considerada a melhor, senão a mais requintada do mundo), tem também o "Pére Lachaise" e ao se penetrar os seus portões depara-se com os segredos ocultos da outra vida. Não se trata de sugestão de necrófilo ou mesmo um certo gosto mórbido de pesquisar os fenômenos do além. Visitar o "Pére Lachaise" é um dever de cultura, é um "brush up" de história da arte! Mas quem foi essa personagem que dá nome à necrópole? A história registra que era um jesuita encarregado de ouvir as confissões do Rei Luiz XIV e tinha um convento na região onde mais tarde foi construido o cemitério que depois tomou seu nome. O portão principal se abre para a avenida Menilmontant (existe até uma bela canção inspirada no bairro, cantada por Charles Trenet, salvo engano). O "Pére Lachaise" atrai mais visitantes do que qualquer outro cemitério devido à plêiade de personagens que ali repousam e que se celebrizaram através das letras e das artes, e também da ciência. São 97 quadras e é dificil não descobrir em quase todas um nome conhecido de escritor, de músico ou político, e desses últimos quero distância, ainda que não se possa estabelecer uma analogia com o nosso pais). Aos românticos recomenda-se o túmulo de "Abelardo e Heloisa" , amantes do século XXII cuja pesada cruz que o destino impusera não arrefeceu a paixão que viveram, mesmo após a separação: Abelardo, monge mais velho 22 anos do que sua aluna, deu-lhe um filho. Heloisa foi levada para um convento distante, porém as juras de amor continuaram durante vinte anos, quando então morreu Abelardo. Sobre a lápide lê-se a inscrição: "unidos agora, numa felicidade eterna". Não é uma linda história de amor?

Momentos de paz, recolhimento e de uma solidão muito doce me envolvem quando aqui venho e eu quase deixo de ser fisicamente para visitar esses mortos ilustres de Paris e de outras plagas que deixaram na terra a marca da eternidade através do gênio...

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.



Wednesday 13 January 2010

London, London...



Atingindo a adolescência eu já era bastante ledor e estava naquela fase do ceticismo vaidoso descambando pra o ateísmo confesso (note-se que já lia Eça de Queiroz e até Nietszche, que chegaram-me às mãos através da erudita professora Heloisa Sena...) Remoto esse detalhe já tâo distante para colorir com todas as nuances possíveis quão mágico foi o meu primeiro passeio por Londres. Eu tinha o texto, a literatura e os sonhos e agora estava ali, não só fazendo parte da paisagem da milenar cidade, mas interagindo com ela e seus tipos...Tendo saído de um frio avassalador, foi dificil chegar, mesmo de taxi, à Paris Nord, de onde parte o Eurostar com destino a Londres.Também nessa cidade de encantos vivi grandes momentos e volto lá sempre convencido que novas e agradáveis surpresas são sempre bemvindas. Em Londres a teia de névoa parece sempre envolver tudo eternamente. Partindo de Paris é de se estranhar que me destine a uma cidade de clima chuvoso, onde nunca se sabe que dia vai cair o verão e que dizem ter clima ótimo para a pele, para a agricultura e a cultura. A terra da rainha, a atrair milhões de visitantes, evidentemente, é parada obrigatória a qualquer um que zele pelo "savoir faire". Num artifício que virou estilo, a escuridão dos interiores vitorianos, com camadas de cortinas, é mais para se proteger da sujeira do "fog" do que do olhar indiscreto dos vizinhos. Já no século I (e Londres tem mais de 2 mil anos!) o historiador romano Tácito percebeu uma bruma frequente nas ilhas britânicas. Com a revolução industrial e o aumento da poluição, essa bruma virou hoje o falado "fog", tão bem explorada no cinema de gênero suspense (Já assistiram o novo Sherlock Holmes?) e presente na literatura, sobremaneira em Charles Dickens. Logicamente o Tâmisa não é mais belo que o Sena. E se Paris é chique e feminina, Londres é elegante e masculina, como já disse a jornalista e escritora Beth Lima! Mais adiante contarei mais...Hoje é só um destraido e descompensado exercício de lirismo para denotar minha paixão ...


Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


New York F*****g City!

Confesso-me anti simpatizante de muitas coisas correlatas a essa ex colônia britânica para também assumir minha paixão pela Big Apple! New York City é tudo de bom e o Central Park, mesmo planejado até a última pedra, é lugar aprazível e cinematográfico... Há em mim talvez uma falta de identidade cultural com os americanos, mas deixando um pouquinho a pecha de chato de lado, digo-lhes, nobre leitores, que nessa cidade as coisas acontecem! Tal e qual farei com Paris, Londres, São Paulo e outros lugares lindos mundo afora que já tive o prazer de conhecer, New York merecerá, com certeza, um texto próprio que vos fará lembrar uma ode ao amor!


Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


Moi et Paris!



Após temporada de 20 dias, parcos 20 dias, na sempre pra lá de maravilhosa São Sebastião do Rio de Janeiro e já de volta à Paulicéia mais que desvairada, começo a sonhar com as próximas férias que pretendo passar na cidade luz, em retorno para lá de triunfal... Passear pelas ruas de Paris faz bem ao corpo e à alma de qualquer um...A cidade é puro encantamento, mesmo em época de muito frio, como se faz agora em todo o continente europeu...Publico essa foto e um singelo parágrafo apenas para lamentar o fim das férias e celebrar com todas as pompas a volta à labuta, ao trabalho árduo... Para reforçar mais ainda o ânimo, começo o ano de verdade com a lembrança do passado e a saudade do futuro. Pois sim, do futuro, que com certeza será glorioso como um retorno a Paris!

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.

Sunday 3 January 2010

Uns pés...

Acredito piamente que o grande salto do ser humano no caminho da evolução foi descobrir que podia se firmar e andar sobre os próprios pés! Isso deve ter feito até o cérebro crescer, como diria tio DARWIN, tornando-nos capazes de pensar e ter sentimentos, e também ter a pachorra de se autopromover à casta dita superior dos animais... Esses são meus pés, até ontem cravejados de bolhas...Mas não bolhas doídas... Nada que um spray gelado e caro da farmácia da esquina não resolvesse...Quando vi esses pés em petição de miséria, lavei-os em água fria e os pus para o alto...Ai então cismei a pensar na minha caminhada desde o momento dos meus primeiros passos até aqui... Meu velho pai de um lado da sala, minha doce mãe do outro a me dizer: "Venha Giba...Ande que o mundo é grande!" . Eu não achava o mundo grande. Aliás, sempre vivi no mundo da lua, é fato até hoje, mas sempre tive os pés firmemente cravados no chão...Sim, já fiz muitas caminhadas...Muitas não me levaram a lugar nenhum mas a maioria culminou com histórias de sucesso e finais felizes... Quando o infurtunio se apresenta em uma das minhas estradas, ou há pedras demais no meu caminho, jamais perco o rumo... Dobro à esquerda, à direita, vou em frente pelas veredas e aléias da vida! Morada derradeira não terei... E para continuar a caminhada precisarei de pés, uns pés, meus pés! Remotando à infância e aos primeiros passos, jamais tive medo e porquanto ganhasse o mundo muito jovem já voando com minhas próprias asas, sempre precisei deles para pousar...

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.

O homem e o mar...


Andar em dias ensolarados pela praias cariocas é garantia de diversão pura, mesmo debaixo de 40 graus...Hoje foi dia, entretanto, de curtir a praia de maneira diferente. De longe e quase sempre na sombra, em caminhada deslumbrante pela trilha que circunda o morro da Urca e o Pão de Açucar, numa reserva eivada de plantas nativas da mata atlântica e morada de pequenos macacos e saguis, tão afáveis e cheios de pose como uma amante interesseira... Essa foto, entre milhares, tirada a menos de duas horas prova duas coisas: que Deus existe e que São Sebastião do Rio de Janeiro é e continuará sendo a cidade mais bela maravilhosa do mundo! Doa em quem doer e aconteça e o que acontecer, quem é viajado (também o sou, mas falta ainda conhecer metade do planeta antes que seja tarde) garante que lugar tão lindo no mundo não há! Para onde quer que se olhe há motivos para cliques e flashes... A trilha tem uma parte asfaltada de alguns quilômetros e a partir dali, só acompanhado de guias especializados. Soube-se à boca pequena e os sinais estão claros por toda parte, entretanto que, em sendo cuidado pelos militares, esse pequeno pedaço de paraiso é vigiado com cuidado...E tem que ser. Lastimosamente turista tapuia é incivilizado e ví garrafas de outros dejetos espalhados ao longo da subida. Com guia é possível se ir ao topo... Mas olhar esse mar tão de perto, sentindo o cheiro e a brisa que mais parecem vir do útero da mãe terra, para que ir mais alto? Logo ali pega-se o bondinho... E caminhar por essas paragens fará bem ao corpo e ao coração... É subir às alturas usando os próprios pés! Eita nós, heim???


Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


É...Narciso morreu assim...


Um amigo de infância, genial e letrado, ao ver essa foto no orkut deixou esse comentário: "É...Narciso morreu assim! " No que eu refutei: "Mas Narciso odiava tudo que não fosse espelho, eu não!" Já pude perceber que esse embate se prolongará até o verão do ano que vem, face ao excesso de liberdade somente permitido a dois irmãos que mutuamente se admiram e tem uma história de vida juntos... Ele lá, em São Luis do Maranhão , é um grande educador e um ícone cultural da cidade e do estado... E parece que foi ontem quando corríamos pelas praias do Calhau e do Araçagi no frescor dos nossos verdes anos. Tempo bom que não volta mais. Mas voltando ao Narciso, sinto-me um cidadão dos mais comuns e sem muitos predicados externos que impressionem de cara quem me olhe, quando pensamos nos padrões de beleza globais...Homem baixo, desde sempre franzino e de corpo débil, sempre a sofrer bulling... Anos dificeis, aqueles...Mas o meu troco era contundente...Sempre o primeiro da turma a socorrer os brats de plantão no desespero de passar de ano, terminava por arrumar protetores, entre meninos e meninas... Ah, falar da infância é bom - risos - mas o que eu queria comentar é que, quando em contato com a natureza em qualquer de suas instâncias, acho que minha beleza interior se manifesta e saio radiante em fotos! Muitas delas nem posadas são. Meus companheiros de caminhada, sabedores da minha fascinação em captar momentos, vão clicando aqui, clicando ali...So em câmeras digitais são mais de 10 mil... Ando a capitular o que farei com as outras tantas mil impressas em papel fotográfico e as quais tenho planejado scannear há anos... Say "cheese" !

Copyright gives the author of an original work exclusive right for a certain time period in relation to that work, including its publication, distribution and adaptation, after which time the work is said to enter the public domain.


Search This Blog

Followers

About Me

My photo
I am one of those guys with a fat address book - maybe because all my friends tell I'm charming and clever! But as far as I´m concerned, friendship is a club of seven people which was fully by the time I was 25. We all share the same interests, and we don´t make any demands on one another in emotional terms - which is something I would avoid like the plague. It´s not that I don´t like making new friends easily...They have to cativate me at first...We all grew up in the same social, professional and geographical world that we now occupy as adults. The group of seven offers me as much security and intimacy as I require!